26.11.05

Wintercase San Miguel

Como que em tons de lá lá lá, deixo aqui um post com o mero intuito de marcar uma importante ocorrência: o primeiro concerto presenciado pela minha pessoa em plena capital espanhola, quase 3 meses depois de ter chegado (o trabalho é muito, os bilhetes são poucos..).

Os eleitos? The Decembrists + Dirty Three + Mercury Rev, de passagem por Madrid por ocasião do festival de música independente Wintercase San Miguel (Madrid, Bilbao, Barcelona e Valência).

E que tal, Lourenço? Bom, bastante bom, mesmo. Esquivando-me ao facto de termos (eu e o Nacho, que apesar de não conhecer nenhuma das bandas que iriam subir ao palco nessa noite, tomou uma posição sempre de salutar, usualmente designada como “que se dane!”) chegado tarde e a más horas (quem diria que a expressão "abertura de portas às 6h30" seria sinónimo de "começo dos concertos às 6h30"?) perdendo consequentemente a actuação da 1ª banda, que por mero acaso era a que eu mais tinha "ganas" de ver.

Chegamos então a meio da performance intercalar, a cabo dos australianos Dirty Three, que para aqueles que têm dificuldades patéticas em inglês significa trio sujo e não árvore imunda. Enquanto Nacho estava paralisado e estupefacto, eu regozijava-me perante o líder da banda, um louco com inequívocas parecenças com um sábio e canibal eremita que esteve isolado do mundo durante os últimos 20 anos a comer croquetes de lagartixas que encontrava na sua caverna. Os seus cabelos esvoaçavam em conformidade com o seu incessante saltitar e gestos alucinados na direcção da plateia, enquanto a barba roçava o seu violino que era tocado e vociferado de todas as maneiras atingíveis pela mente humana. Em suma, a puta da loucura. A música é exclusivamente instrumental (para aqueles que têm dificuldades patéticas em termos musicais: o senhor não canta), muito experimental e com constantes viagens entre uma melancolia pacificadora e uma agressividade inspira e incitadora (adjectivos são uma merda eu sei, mas para este tipo de coisas tão peculiares, só mesmo estando lá, foi realmente um espectáculo único, quer musical, quer teatral). Provavelmente ficou tudo na mesma. Resumindo e simplificando, o Nacho achou as músicas todas meio parecidas, enquanto eu, no preciso momento em escrevo isto, estou a ouvi-los.


Para último, obviamente, a banda mais consagrada, os americanos Mercury Rev que, numa só palavra, sim. Sim, foi bom. Sim, confirmaram todas as expectativas com que cheguei ao concerto. Não, não as ultrapassaram, talvez porque eu já estava arrebatado pela actuação anterior. Contrastando com a loucura e a sisudez de Warren Ellis, líder dos Dirty Three, o espampanante vocalista dos MR, de nome David Baker, largou sorrisos e gestos coreografados durante todo o concerto. Sendo a banda bastante mais pop e menos extravagante do que a sua precedente na noite, o público (e o Nacho) esteve bastante mais animado. Algures entre a dream pop e o rock alternativo, tocaram todas as suas canções famosas e outras tantas. Não foi fabuloso, mas é sempre estranho e agradável estar a poucos metros (nesta ocasião pouco mais de 5 metros) de alguém que estamos habituados a admirar e a ver apenas na VH1. Mais uma para o currículo.


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www.dirtythree.com


www.mercuryrev.net


A quem gosta de música, recomendo muito Mercury Rev. A quem adora música, recomento muito The Decembrists. A quem idolatra música e tem ânsia de ouvir coisas novas (em termos pessoais, porque esta banda existe desde 1992), recomendo muito Dirty Three. Para quem não gosta de música, recomendo salada de frutas.

23.11.05

Nogueira e Matthäus - Parte IV


IV. Reflexões Finais


Passando do individual para o subjectivo, o que se passou neste caso? Que força maior provocou este incidente? Na vida, como na selva, o mais forte prevalece. O Macho Alfa acaba sempre por dominar. Muitos machos possuem uma força e um carisma tremendos, mas nunca chegam a prevalecer porque têm no caminho para o estrelato um elemento cujo poderio assombroso o transforma inevitavelmente num superior hierárquico. No entanto, não poucas vezes um macho mediano consegue atingir o estatuto de líder do grupo devido à escassez de alternativas qualitativamente aceitáveis. Para o bem não só de cada grupo individualmente, mas também de toda a espécie como um todo, a melhor solução, obviamente, seria uma correcta e eficaz alocação dos melhores espécimes a cada grupo, de modo a que sejam sempre os predestinados e mais competentes a liderar e a decidir as acções conjuntas de cada grupo.

O futebol, como a vida, é uma selva em que a palavra justiça é apenas mais uma. Somente numa sociedade controlada por entidades supervisoras, uma arrumação óptima dos mais poderosos em locais de liderança poderia ser atingida. Para o intuito desta tese, tal efeito foi atingido. Quem serviu de organização optimizadora de distribuição qualitativa? A grande família comunista? Os progenitores dos “gémeos” Nogueira e Matthäus? Ninguém o poderá provar com certeza absoluta. No entanto, vamos aqui fazer uma reconstituição histórica daquilo que muito provavelmente se terá passado. Recomendo que arranjem um conveniente apoio lombar e um refrigerante, e que se preparem para uma dramática viagem pelo sub-mundo do tráfico infantil europeu, em que as crianças são tratadas como os nacos de carne que são, só que sem salvaguardar os seus sentimentos.



A provavelmente verdadeira história do cisma[1]
pós-parto dos gémeos Nogueira e Matthäus


Decorria o ano de 1962, era o velho continente um local escuro, perigoso, ainda a latejar devido à grande guerra que acabara havia alguns anos. Não estávamos na ressaca da guerra, mas arrisco a dizer que estaríamos na adolescência da mesma. Como muitos semblantes adolescentes, a Europa apresentava-se fustigada por constantes erupções, comichões, crises e óleo. Não era, portanto, o cenário propício para o nascimento de dois magistrais talentos futebolísticos. Mas, tal como a primeira flor nasce após o Inverno no local mais inóspito, também neste caso os gémeos brotaram do seio (não literalmente) de sua mamã.
Estando nós ainda na década de 60 (que vai de 1 de Janeiro de 1960 até 31 de Dezembro de 1969), os progressos médicos não eram semelhantes aos que se verificam hoje. Eram ligeiros avanços, se assim podemos dizer. Ponto positivo: já existiam as luvas. Infelizmente, apenas um par, que era utilizado em todos os partos. Não havia, portanto, como verificar a quantidade de rebentos que suportava a barriga de uma madame que, não poucas vezes, era fechada antes de tempo e ainda com um gémeo lá dentro. Este infeliz ficaria para sempre autista, a viver dos excrementos da sua mãe e a ser incomodado pelo zarolho pénis de seu pai enquanto os seus progenitores praticavam a milenar arte da fornicação. Obviamente cresceria deformado, qual pé de uma tradicional fêmea chinesa cuja progressão saudável não é permitida.
Nunca veria a luz do sol, nunca sentiria a água do mar, nunca saborearia nada para além de fezes maternas. Mas para o caso isto não interessa, pois não foi este o desfecho da nossa história.
Que se terá passado neste caso particular?, deverá estar neste preciso momento o sonolento leitor a questionar. Sinceramente, não sei. Podia agora tentar adivinhar, podia ir a um médium e pedir-lhe para se fazer possuir por um espírito todo-sabedor, podia também ir para a rua saltar à corda à espera que um papiro com toda a história que procuramos escrita por monges centenários me caísse dum bolso. Mas todos nós sabemos que isto faz tanto sentido como as bolachas de água e sal. Assim sendo, vamos apenas supor que aconteceu o mais óbvio: um deles nasceu e ficou com os pais, o outro era feio e foi posto num aquário, onde viveu os seus primeiros anos, desenvolvendo mãos com membranas e uma apetência invulgar para bruços. Daí até ser descoberto por um olheiro de Portugal, essa potência mundial da arte da piscina, foi um passo de bebé. O resto da história canta-a o vento, e quando o vento canta, o povo encanta.

O importante, digo eu do alto de toda a minha incomensurável sabedoria, é houve um final que, embora desconhecido, foi feliz. A todos os intervenientes nesta épica história de amor e sexo zoófilo agradeço e desejo as melhoras aos vossos animais de estimação.

[1] A aplicação do substantivo “cisma”, embora aparentemente contestável para a separação em discussão, acaba por ser justificada. Senão vejamos: o que sucedeu vai muito para além de uma singela opção por caminhos de vida diferentes, trata-se de uma total divergência de vivência que foi iniciada no momento do nascimento dos dois jogadores. Involuntária, é certo, no entanto trata-se de uma cisão do mais extremo de que há memória, digna de ser comparada, por exemplo, à mudança de religião de Cassius Clay, ao divórcio litigioso de Rod Stewart, ou mesmo ao primeiro romance de João Catatau.

Nogueira e Matthäus - Parte III



III. Argumentos Irrefutáveis


Após esta exposição inicial dos sujeitos em questão para esta tese, vamos passar à secção dos factos indesmentíveis. Muitos poderão argumentar que apenas se trata de coincidências miraculosas. Mas, meus amigos, uma dezena de coincidências miraculosas? A apreensão dos mais cépticos ver-se-á progressivamente desnudada perante a frieza e evidência factual daquilo que me preparo para apresentar.
Vamos então largar as premissas, para aquilo que será certamente descrito em anos vindouros como uma das maiores touradas argumentativas de que há memória:



(a) Ambos os intervenientes têm barba, senão vejamos: Matthäus apresenta-se no rectângulo de jogo com a sua barba de 2 dias, enquanto Nogueira exibe orgulhosamente a sua barba de 2 anos.



(b) Ambos prezavam pela “polivalentia”: Médios? Defesas? Jogadores que recebem a bola, levantam o queixo e a entregam no pé do matador da equipa? Incansáveis pragas assassinas que não descansam enquanto não exterminarem todo e qualquer perigo para as redes da sua equipa? Ninguém sabe ao certo, pois o seu teor de polivalência faz com que todos estes atributos e muitos mais se fundam num único jogador, exemplo acabado de profissional exemplar, vangloriado pelos treinadores, temido pelos oponentes e, ao mesmo tempo, admirado pelos mais jovens que sonham em ter com eles uma relação homossexual que os levará à equipa A.



(c) Ambos eram os maiores jogadores presentes dentro das quatro linhas: Nogueira, usualmente, era o maior elemento em termos quantitativos. Matthäus, por seu lado, superava qualitativamente os restantes jogadores em campo.



(d) Ambos os jogadores foram internacionais, não interessa que tal se tenha verificado por países diferentes, pois vivemos numa Europa que exibe orgulhosamente a sua unicidade e, como tal, devemos salutar e não criticar esse aspecto. Assim sendo, Nogueira foi sete, repito sete vezes internacional pela selecção das quinas, tenho feito o gosto ao pé por duas vezes, o que dá uma média de 0,2857 golos por partida. Matthäus representou a Mannschaft por 150 ocasiões, tenho marcado 23 golos. Média de golos por jogo? 0,15(3). Voltando ao que já referimos na primeira apresentação dos jogadores, e tendo isso como um dado provado ao qual acrescentamos este pequeno detalhe estatístico, temos que ambos os jogadores eram tidos na época como elementos preponderantes para as tácticas das respectivas selecções. O facto de fazerem regularmente o gosto ao pé apenas acentua e torna mais provável o facto de serem descendentes dos mesmos genes.



(e) Já que entrámos no mundo dos números, vamos agora analisar os envergados pelos jogadores na parte dorsal das suas camisolas. Nogueira entrava usualmente em campo equipado com a camisola número 6. Matthäus, por norma, envergava a 10. Trata-se, obviamente, de dois vértices de um losango de meio campo. Mas a magia dos números ultrapassa a lógica humana e leva-nos muitas vezes para mundos quadriláteros. 10 + 6 = 16. Coincidência? Meus amigos, coincidência é a estratégia de refugo para aqueles que têm os olhos tapados por sobrancelhas barbaricamente grandes. Parece-me que para meio entendedor meia palavra basta e, mesmo se não conseguiu compreender este meu argumento, pode sempre entender as palavras que escrevi, em separado.



(f) A data de nascimento, que obviamente foi forjada. Não existe algo como o crime perfeito. Aliás existe, mas tal se soubesse deixaria de ser perfeito. Alguém mete sempre o pé na argola e deixa uma pista para trás, podendo deitar tudo a perder naquilo que era um plano aparentemente imaculado e cujo planeamento tinha sido cuidadosamente elaborado durante anos. O ser humano é uma máquina magnânime e complexa, mas de modo algum incólume a erros. Assim sendo, ao fraudulentamente adulterarem a certidão de nascimento dos “gémeos” Matthäus e Nogueira, cometeram um deslize que pode passar imperceptível ao olho desarmado: Nogueira “nasceu” a 21 de Setembro de 1963; Matthäus “viu-se parido” a 21 de Março de 1961. Como é possível terem feito uma equação de falsificação assim tão óbvia? Basta uma máquina de calcular, que nem precisa de ser científica, para descobrirmos a verdade. Se não bastasse o facto de não terem alterado o dia do nascimento, vamos facilmente conseguir descortinar qual a verdadeira data de nascimento de ambos os fulanos: o mês 3 mais o mês 9, somados, dão o mês 12. Toda a gente sabe que meio Dezembro equivale a um Junho. A média nunca falha. Usando o mesmo teste infalível no ano de nascimento, note-se: (1961 + 1963) / 2 = 1962. Conclusão por demais óbvia: Os “gémeos” nasceram dia 21 de Junho de 1962.



(g) Como se todos os argumentos até agora não bastassem, recorro agora, quiçá golpeando baixamente, às indesmentíveis e inalteráveis provas fisionómicas: Ambos os gémeos se apresentam com mais de 1,75 metros de altura. Nogueira, com quinze centímetros a mais do que a fasquia estabelecida, enquanto Matthäus ultrapassa a mesma por 2 centímetros. Isto comprova não só as semelhanças físicas, como também nos dá a entender das duas uma: ou Matthäus foi o primeiro a sair, prematuro por ligeiros segundos, tendo ficado mais minguado do que o seu irmão, que ficou em posterior gestação durante o tempo equivalente a 13 centímetros de altura; ou Nogueira saiu primeiro, tendo endireitado a espinha mais cedo do que o irmão, que ficou esquecido e deixado a atrofiar no ventre da mãe (a referência aos avanços médicos nos inícios da década de 60 serão tratados posteriormente neste mesmo exercício). Os mistérios da germinabilidade são vastos e obscuros, pelo que podemos apenas especular.



(h) Passando ao peso, em quilogramas, verificamos que Nogueira pesava (enquanto atleta de alta competição e regido pelas mais finas dietas atléticas de que há memória) 77 kg. Matthäus? 75 kg. A diferença de peso é claramente justificada pelo desfasamento de saída do ventre da progenitora, que como é do conhecimento público se rege pelo seguinte teorema: [a raiz quadrada da diferença (em segundos) de saída do ventre entre os gémeos, elevada a 9 exponencial e dividido pelo mínimo múltiplo comum da distância entre o umbigo e o queixo da progenitora, dá um número. Multiplicando esse número por zero e somando dois, dá a diferença em quilos que os gémeos terão na sua idade adulta e enquanto forem futebolistas profissionais]. Fazendo as contas, vemos que tudo bate certo. Como se tal não bastasse, a similitude entre os 77 kg de Nogueira e os 1,77 m de Matthäus parece-me por demais arrebatadora.



(i) A fisionomia é, de facto, irrefutável. No entanto, e de modo a silenciar as últimas gralhas criticas, vamos ainda utilizar um testemunho que, obviamente e de acordo com as normas em vigor no Grande Compêndio de Regras de Utilização Fictícia de Testemunhas Abonatórias Inexistentes, nos vai relatar uma pequena situação. Vamos respeitar o anonimato requerido por quem nos vai relatar os factos que se seguem:


Inquiridor: É verdade que tem conhecimento de factos concretos que provam, sem margem de dúvida, que Nogueira e Matthäus são irmãos gémeos separados à nascença?
Inquirido: É verdade, sim senhor.
Agora, meus caros, só não acredita quem não quer.



(j) Finalizo com o “corolário do argumentador factual”, que durante décadas tem servido de suporte a milhentas teorias que vêm explicando desde o extermínio dos dinossauros até ao nascimento de seis dedos em algumas pessoas: «Aproximadamente dez argumentos constroem um facto que não pode ser refutado sem que se prove previamente como nasceu o universo».
Se contar os argumentos expostos, verificará que, de facto, são dez. Assim sendo exclamo aqui que Nogueira e Matthäus são, de facto, gémeos, como queria demonstrar.

Nogueira e Matthäus - Parte II

II. Apresentação

António José Nogueira Santos jogou em diversos clubes de renome em Portugal, caso de um Académico de Viseu, um Penafiel, um Boavista ou mesmo de um Vitória Futebol Clube. Alegadamente, nasceu em Lisboa.
Viajando de volta à época de 92/93, Nogueira jogava a trinco, equipando de axadrezado, e era simplistamente descrito como…

«É um jogador de claro perfil defensivo, como bem o demonstra o facto de ter jogado como central, em muitas ocasiões. É muito apreciado pelo seu desenvolvimento físico, a sua capacidade de anular o jogo rival e o domínio correcto da bola. Está na órbita da selecção.»

Vamos analisar este testemunho: Órbita pode ser entendido como limite, que por sua vez pode ser interpretado como meta. Conclusão? Que Nogueira era o “alvo” da selecção, um jogador-chave por onde todas as jogadas tinham obrigatoriamente que passar, para que ele tomasse as rédeas de toda a equipa e a conduzisse ao caminho da vitória e do sucesso. Retomaremos este pensamento mais adiante.

Lothar Matthäus começou no Borussia de Mönchengladbach, tendo passado posteriormente doze épocas em Munique, ao serviço do Bayern, intervalados por quatro anos na série A ao serviço do Inter de Milão. Acabou a carreira em 2000 ao serviço dos Metrostars, equipa norte americana outrora orientada por esse símbolo da coordenação técnica lusa, Carlos Queiroz.


Detém o recorde do jogador com mais presenças em fases finais de Mundiais, cinco (’82, ’86, ’90, ’94, ’98), em conjunto com o antigo internacional mexicano Carbajal. Com este único dado estatístico podemos comprovar que, tal como Nogueira, Matthäus era também pedra fulcral na estrutura táctica da sua selecção.
Em 1990, ano em que conduziu a Alemanha à vitória final no mundial de Itália, foi eleito melhor futebolista do mundo, título que manteve no ano seguinte.

O que acabei de relatar prova, indiscutivelmente, que estamos perante dois jogadores de enorme talento futebolístico, dois marcos na história do desporto que servem de referência tanto a jovens como a historiadores. Mas de factos históricos está o armário cheio, e o que todos nós queremos são dados concretos, provas que tornem esta especulação lançada pela minha pessoa em algo de concreto, algo de tangível. Como uma tangerina nas mãos de um rapaz da República Centro Africana, também eu descascarei todas as falcatruas e aldrabices que enublam toda a história destes dois irmãos gémeos. Sem mais demora, passemos ao sumo deste meu trabalho, à parte vitaminada.

Nogueira e Matthäus - Parte I

Nogueira e Matthäus, separados à nascença
Os pontos de vista expressos neste “working paper” são da exclusiva responsabilidade do autor. Está expressamente proibida a sua total ou parcial utilização fora deste mesmo blog. Ass: a gerência.

I. Introdução

Parece-me desagradável, para não dizer ordinário, começar esta minha exposição ideológica sem previamente apresentar os dois intervenientes. Assim sendo, vou primeiro dizer o que me levou a escrever este trabalho.

Quando penso no futebol dos anos 90, certas figuras saltam-me imediatamente à memória. Não é um golo particular de Lima, esquerdino do Sporting, nem um auto-golo de Jorge Bermudez contra o Belenenses em pleno estádio da Luz que me faz amar este desporto. São as trajectórias. Começar no ponto A e acabar no X, podendo entretanto passar pelo H, L ou mesmo I grego. O início de uma carreira num clube desconhecido, o descortinar por parte dum técnico visionário que ali poderia estar um talento, a oportunidade dada ao atirar o jovem atleta aos lobos numa complicadíssima deslocação a Vidal Pinheiro, o agarrar ou não dessa chance, o estrelato ou o desvanecer pelas divisões secundárias. Os golos são o sal do futebol, é certo. Mas o sal sozinho apenas nos dá sede. O sal é algo que condimenta um prato recheado com arroz malandro e bitoque com ovo a cavalo. A salada, no prato ao lado, espreita sorrateiramente o prato principal, desejosa de saltar para a ribalta. Assim é o futebol.
barnjak protege o esférico enquanto nogueira, por detrás, emana odores corporais de modo a prejudicar a acção adversária.

Temos então o desporto rei como um prato típico de um qualquer café central. Não será este o tema primordial em qualquer conversa passada no mesmo? Não irão todas as estradas labiais desaguar no mesmo terminal? Em futebol? Parece-me não só que sim, mas também que sim, senhor.

Parece-me também que quando pensamos em jogadores que marcaram toda uma era no futebol português, vem-nos à memória nomes como Milton Mendes, Caccioli, Dino, entre muitos outros. Jogadores que eram tema de conversa num tempo em que ainda não havia um Big Brother, um processo Casapiano, em que a concorrência mais forte eram programas apresentados por Badaró. E, no mano a mano com o “entertainer” brasileiro que tanto brincava com crianças como com seios desnudados de strippers, Bóbó levava invariavelmente a melhor, Ivkovic acabava sempre por desviar para canto e Constantino conseguia todas as santas vezes desfeitear o apresentador.

Falo daquela época do futebol nacional em que o rectângulo de jogo, de Outubro a Março, abandonava o nome de relvado para adoptar a denominação de enlameado. Das bolas diadora, dos árbitros vestidos de preto, da equipa titular numerada de 1 a 11.

Refreando um pouco os ânimos, dou sequência, agora sim, à apresentação dos dois visados, num reencontro proporcionado pela minha pessoa que, certamente, irá fazer corar os produtores do Ponto de Encontro.

Hey, Pérola Negra (ler cantarolando, sff)

Renegando desde já à regra anti-futebol estabelecida num dos primeiros posts, vou dar destaque a um atleta que à muito o merece. Se atleta se escrevesse com h, então o jogador em questão seria um hatleta com H grande. No entanto, enquanto as regras da escrita não se alteram, tenho de me conter e evitar fazer tão ousada declaração.

Poderia falar de Washington Rodriguez, extremo esquerdo à antiga que Manuel Damásio trouxe para o clube da Luz em meados da década de 90, mas não o vou fazer. E não o faço por 2 razões: porque ninguém se lembra dum determinado peido que a certa altura largou e porque o norte americano tinha um penteado que ronda as bandas do nauseabundo.

Michael Thomas. Para muitos, apenas um nome. Para outros, o actor que fez parelha com Don Johnson em Miami Vice. Para um reduzido número de pessoas, um marketeer norte-americano empenhado em ajudar o próximo, renegando ao demoníaco lucro monetário. Para mim e para mais dezassete mil pessoas, um trinco ímpar, à frente do seu tempo, um negro que liderou e se tornou exemplo numa época em que os negros eram socialmente mais escuros do que nos dias que correm.


E sem mais demoras, vos apresento Michael Thomas, o futebolista:

Antigo internacional inglês e estrela em clubes como o Liverpool e o Arsenal de Londres, veio para a Luz rotulado como o “homem que vai pôr este meio campo na ordem”. No entanto, vá-se lá saber porquê, os sempre ponderados, escrupulosos e elegantes aficionados benfiquistas nem lhe deram o benefício da dúvida. Mal os colegas lhe endereçavam a bola, um ensurdecedor coro de assobios viajava do terceiro anel ao relvado. Pura e simplesmente, o já-não-tão-jovem-como-outrora Michael não conseguia estabelecer o contacto silencioso com o couro.


Dono duma velocidade digna dum poste de electricidade, compensava através da perfeição com que executava a vertente táctica do jogo. Canalha esta sociedade que habitamos, na qual as qualidades tácticas são apreciadas somente por treinadores e comentadores, escapando ao olhar do vulgar adepto de futebol. Só passa a redondinha para o lado? Assobia! Não sobe perigosamente no terreno para fazer o gosto ao pé? Assobia! Não tem as unhas cortadas convenientemente? Assobia e cospe!


Como certos gurus do relato diriam, tratava-se de um jogador «esclarecido, de cultura táctica, importante para o grupo de trabalho». Como certos misters de bancada diriam, isso é uma boa descrição para o encarregado da relva, para o condutor do autocarro dos jogadores, ou para o cabrão que anda a pinar a minha mulher.


Voltando às assobiadelas, todos nós sabemos o quão desagradável é ouvir um enorme coro deles vindo de 50.000 pessoas. Ou talvez não o saibamos, mas com um pouco de senso comum enquanto equipados com justos calções encarnados, certamente que conseguimos imaginar. Para aqueles que ainda estão com dificuldades, imaginem o incómodo que será voar com um bando de aves barulhentas enquanto emigram para climas mais quentes (partimos do pressuposto que o leitor se imaginou como uma das aves, ao invés de como um ser humano mutante alado).


Se cada vez que a bola tocava em Thomas era meio caminho andado para uma valente enxaqueca, os jogadores do Benfica começaram a fazer o lógico: ninguém passava a bola ao trinco britânico. Este ficava no meio do campo a pedi-la incessantemente, mas o esférico, para bem dos tímpanos ao nível do relvado, nunca lhe chegava. Assim sendo, Souness acabou por ver que, a atacar, o seu Benfica jogava 10 contra 12, pois Michael Thomas cortava uma imensidão de linhas de passe. E foi assim o jogador que veio da terra dos Beatles caiu em desgraça no seio da equipa e perdeu o lugar como patrão do miolo encarnado.


Não obstante, e apesar de ter chegado a Portugal putrefacto, Michael Thomas foi sempre um digno cumpridor do código de conduta do clube, algo que salutamos, ou não fosse o nosso lema «Antes um valente aselha mas bom profissional do que um anão em campo».

18.11.05

Prova inequívoca de que estou, de facto, em Madrid

Muitas pessoas dirigiram a palavra à minha pessoa como que dizendo algo em tons de:

“Tudo bonito, amizades? Ouvi dizer que estavas por Madrid. Prova!”

“Agora não posso, estou com uma caganeira digna de um búfalo, fica para depois, ok herói?” – replicava eu falsamente, de modo a tentar escapulir-me à apresentação da requerida prova.

A verdade é que finalmente a tenho: o meu passe social que utilizo todo o santo dia para ir de casa para a escola e, vá-se lá saber porquê, também da escola para casa.


Episódio-triste-desnecessário-que-83%-das-pessoas-guardaria-para-si-próprio:

Como podem ver, o passe é formado por uma merdinha de papel que é o ingresso propriamente dito, e um invólucro de plástico que contém o meu nome e foto, de modo a associar o supracitado à minha pessoa singular. Pareceu-me aborrecido, já para não dizer extremamente aborrecido, ter de tirar o "piqueno feto" da "nave-mãe" toda a santa vez que quisesse entrar no metro. Então deduzi (é verdade, eu deduzo em itálico) “isto deve funcionar com um sensor qualquer, ao estilo caixas de supermercado ou entradas em Alvalade”. Agindo de acordo com o que havia pensado, comecei a passar incessantemente o meu Abono de Transportes à frente dos torniquetes do metro (mais propriamente diante de umas superfícies escuras e espelhadas). Um minuto naquilo e nada… até que uma velhinha que estava estupefacta à minha espera me demonstra a acção correcta a executar perante a situação com que me deparava:

Acção #1: Retirar o bilhete da capa encarnada (não querendo ferir susceptibilidades, capa vermelha! dois beijinhos a quem se sentiu ofendido);

Acção #2: Inserir o bilhete na ranhura própria para tal acção;

Acção #3: Passar pelo torniquete e recolher o bilhete no “lado de lá”;

Acção #4: Exprimir o seu estado de alma “puta que pariu, então é assim que este cabrão funciona?” e agradecer à simpática velhinha espanhola “gracias, meretriz”.


Bem, caríssimos, podia agora dizer que me tinha que ausentar pois tinha uma vontade de cagar apenas comparável à sensação de ter um rouxinol a tentar escapar-me do anal, mas a verdade é que não tenho um gajo na aula chamado Gabriel e vou chorar para casa essa lacuna.


Despeço-me com uma palavra: Doravante.